Junot em Torres Vedras

Por ocasião das comemorações do 1.º Centenário da Batalha do Vimeiro (20 e 21 de Agosto de 1908), o jornal Vinha de Torres Vedras, no n.º 761 (20 de Agosto de 1908) publica um episódio curioso sobre a estadia de Junot em Torres Vedras na véspera da referida batalha (21 de Agosto de 1808). Sob o subtítulo Episodios o artigo narra o seguinte:
« Dias antes da batalha do Vimeiro, em que o patriotismo dos portuguezes tinha chegado ao auge, os francezes não se podiam afastar do campo das operações, sem que fossem mortos pela populaça.
O general Junot, ao facto da sua má situação mandou chamar os superiores de todas as casas religiosas que havia no concelho, pedindo-lhes que pela muita influencia que exerciam n'estes povos lhes aconselhassem que Napoleão queria fazer a felicidade dos portuguezes.
Os primeiros religiosos ouvidos foram os gracianos, do convento da Graça d'esta villa, e os do convento de Penafirme, que lhe responderam diplomaticamente mas sem prégarem nem aconselharem os povos á obediencia.
Os segundos foram os arrabidos do convento do Barro, que responderam que sim, aconselhando e prégando á obediencia.
Os terceiros foram os varatojanos, da ordem de S. Francisco, que se apresentaram com os seus habitos: de sandalias, cabeça rapada, á Santo Antonio e vestes de grosso burel.
Foi Paulo de Santa Thereza quem os representou, pois era n'essa egreja o superior.
A sua resposta foi que coisas contra a sua consciencia não as fazia, isto estando aqui um exercito de perto de 20:000 francezes.
Instado para que aconselhasse a communidade, tornou a responder que o não fazia, pois era contra a sua consciencia.
Os primeiros ouvidos que foram, e mo já dissemos, os gracianos e os do Barro, receberam todas as attenções do estado maior de Junot, sendo acompanhados até á porta.
Os franciscanos, esses, pela sua resposta, foram despedidos em harmonia com a sua austeridade, aos empurrões e deitados pela escada abaixo, ficando ferido o superior na cabeça, e que ao levantar se disse: « Eu não faço, nem mando fazer coisas contra a minha consciencia.»
Isto passou-se no predio d'esta villa, em que reside hoje o Antonio das Caldas, e que n'esse tempo era propriedade do benefeciado Malaquias, e está situado no largo da Graça, conservando ao presente a mesma escada e o aspecto. [...]»
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(Fotografia da casa onde se pensa que foi o Quartel General de Junot. Imagem publicada por RAFAEL, Salinas Calado - No Primeiro Centenário de Madeira Torres. Torres Vedras: Tip. Progresso Industrial, 1936.) Fonte da imagem: http://vedrografias2.blogspot.com/
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À parte da curiosidade da estória, é possivel através do relato localizar o quartel-general de Junot na véspera e dias seguintes à batalha do Vimeiro. De facto, atribui-se à casa actualmente ocupada pela loja Corte Ideal, na Praça da República, o quartel general de Junot durante a sua estadia em Torres Vedras. Porém o jornal Vinha de Torres Vedras não indica a fonte de onde retirou a informação de modo a possibilitar a confirmação da autenticidade da narrativa. Porventura seria tradição oral que passou a escrito nesse mesmo artigo?

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